Ciclo de Cinema de Novembro às Quintas na Academia Problemática e Obscura

Ciclo de Cinema "Viagem na História da República Checa"



Formando parte do coração da Europa, a presença do cinema Checo é quase inexistente em Portugal. No entanto, não só é a Escola de Cinema de Praga (conhecida como FAMU) uma das mais importantes da Europa, como também a sua indústria conta com anos de produção de qualidade. Num país com praticamente a mesma população de Portugal produzem-se à volta de vinte filmes por ano contando com uma presença evidente do público Checo nas salas de cinema. Com esta sessão esperamos dar a conhecer não só as características fundamentais do cinema Checo em todos os seus traços típicos e reconhecíveis, mas também uma viagem pela história da República Checa começando na Segunda Guerra Mundial e terminando com a entrada do país na União Europeia em 2004
Patrícia Paixão
 
 
 
3 de Novembro                                                                    
Quinta-feira 21h30 

Shop on Mainstreet – A Pequena Loja na Rua Principal” 
(Obchod na korze, Realizadores: Ján Kadár e Elmar Klos, 1965)

Sendo um dos filmes premiados deste conjunto (vencedor do Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 1967 e com uma nomeação para melhor actriz em 1967), representa também um clássico Checoslovaco. Embora o filme traga algumas polémica relativamente a que nação “mais” pertence (se à República Checa ou se à Eslováquia), a verdade é que este espelha a realidade não só de dois países mas da área que ocupa a Europa Central durante a Segunda Guerra Mundial. “A Pequena Loja na Rua Principal” conta-nos a história de Tono Brtko (Jozef Kroner), um homem de poucas ambições a quem lhe é oferecido a proposta, pelo seu cunhado, de “arianizar” a loja da senhora Lautmanová (Ida Kamińska), uma Judia idosa que vive sem medo do futuro incerto e com confiança no seu negócio. O filme lida com a incerteza de Tono, por um lado em tomar o partido da ideologia Nazi e ir de acordo com as espectativas da sua mulher e do seu cunhado, por outro, em aproveitar-se de uma idosa e do seu negócio para o seu proveito e segurança futura. No entanto, o cenário começa a mudar quando Tono descobre que o negócio não é tão lucrativo como pensa e quando uma relação se desenvolve entre os dois. O filme abre portas aos temas que se tornarão lugares comuns no cinema Checo, o anti-herói, um conflito existencial e a dualidade entre os pequenos dramas como metáforas para tragédias maiores.
 
Vê o trailer aqui:
 
 
10 de Novembro                                                                   

Quinta-feira 21h30

“Black Peter – O Ás de Espadas” 
(Černý Petr, Realizador: Miloš Forman, 1963)

“Black Peter” não é apenas a primeira longa-metragem de um realizador que apenas mais tarde se viria a consagrar nos Estados Unidos, é também um filme que assinala o início da “New Wave” Checa e dos “Dourados Anos 60”, de um conjunto de realizadores (Jiří Menzel, Vera Chytilová, Jaromír Jireš, ou Jan Němec) que demonstrariam a sua criatividade e experimentalismo até à chegada da Primavera de Praga e a invasão soviética de ‘68.  Seguimos assim os passos de um adolescente que pouco se interessa pelo trabalho numa mercearia arranjado pelo seu pai a “espiar” clientes. Petr (Ladislav Jakim) parece ainda menos interessado em seguir quaisquer expectativas que os pais tenham para ele, a sua dedicação intensifica-se em impressionar a rapariga dos seus sonhos. Com “Black Peter” surge-nos a compreensão que o interesse de cada jovem não será seguir as normas da sociedade, mas aproveitar os prazeres mundanos enquanto lhe é possível. Duas características parecem marcar este filme que mais tarde serão uma constante em Forman. Uma delas, a música sempre presente, que nos faz querer dançar e voltar aos anos 60, o rock ou twist, mesmo que ainda em Checo. A outra, a sinceridade que, apesar de nos ser requerido comportar ou dedicarmo-nos a preocupações maiores, aquilo que nos move, seja a música ou até uma paixão, será sempre mais forte. Sem dúvida, “Black Peter” far-nos-á rir e sorrir, em especial pela sua despreocupação e irreverência, mas também por um começo na constante rebeldia e desacordo com a autoridade de Forman.
http://youtu.be/ZeLw07-CtEg
17 de Novembro                                                                   

Quinta-feira 21h30

“Kolya” (Kolja, Realizador: Zdeněk Svěrák, 1996)
O segundo vencedor desta lista de um Oscar para melhor filme estrangeiro traz-nos uma história mais leve, a relação entre uma criança Russa de cinco anos que dá vida à personagem principal, Kolya (Andrej Kalimon) e Franta Louka (Zdenek Sverák), um violoncelista demitido da Orquestra Filarmónica Checa que se dedica a tocar em funerais. Em troca de algum dinheiro Franta aceita um casamento arranjado com uma Russa. No entanto, pouco tempo após ela partir para a Alemanha Ocidental Franta ver-se-á a braços com o filho da sua dita “mulher”. Apesar dos problemas linguísticos entre os dois e da vida de Franta pouco dada à parentalidade a relação cresce. Como pano de fundo vemos as sombras de um regime prestes a mudar, onde um conformismo há muito parece ter-se instalado. Ignorar a realidade refugiando-se no campo ou tentando mostrar resistência em pequenos actos como não pendurar uma bandeira Soviética na janela parecem ser soluções para uma colaboração menos visível. Apesar de críticos como Andrew Horton de Kinoeye terem denunciado a vertente de “conto de fadas” do filme e o seu carácter nostálgico perante um regime que foi também ele brutal, a verdade é que “Kolya” retrata a vida de pessoas comuns que ironicamente se confrontam com o próprio inimigo numa versão infantil. O filme serve-nos também uma incrível banda sonora de música clássica, contendo nomes como Antonín Dvořak, Bedřich Smetana ou Felix Mendelssohn-Bartholdy.
http://youtu.be/HfVSvI4fo-s

24 de Novembro                                                                   

Quinta-feira 21h30

“Czech Dream” (Český sen, Realizadores: Filip Remunda, Vít Klusák, 2004)
Com registos memoráveis no cinema documental “Czech Dream” tenta reavivar essa herança num filme de fim de curso realizado por dois estudantes da Escola de Praga. Aclamado por pessoas como o ex-Presidente Checo, actor e dramaturgo Václav Havel ou até por Michael Moore, o também chamado “Filme do Hipermercado” serve-nos uma espécie de reality show denunciando todas as técnicas de venda e consumismo cego, toda a “filosofia” que envolve as cadeias de supermercados. Filip Remunda e Vít Klusák servem-nos uma atrevida experiência. E que tal criar o nosso próprio supermercado? Informam-se de tudo o que é preciso, desde a imagem de managers, à publicidade, passando pela criação dos panfletos com preços absurdamente atractivos ou até à compreensão dos clientes das superfícies comerciais, chegando por fim ao dia de abertura... Tudo para criar o supermercado perfeito. A eles começam-se a juntar equipas de especialistas de renome interessadas pela experiência. No entanto, “Czech Dream” não existe apenas pela experiência em si e por aquilo que o supermercado representa, mas por todo o mecanismo que está por trás e que possibilita a ascensão e proliferação destas superfícies. O filme estreou-se no mesmo ano da entrada da República Checa para a União Europeia, gerando na altura algum debate, questionando a validação da entrada ou mesmo na aplicação do dinheiro para propaganda política. A abertura do filme diz tudo, contrastando uma época onde se formavam filas para obter comida para outra onde se fazem filas para a abertura de supermercados. Podemo-nos rir com o ridículo, mas não será ele tão real? 
 
Vê o trailer aqui:
http://youtu.be/cKFUuMr63EM

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